terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

SIMPLEX COMPLICADEX!

12:45h, Campus da Justiça, IRN (Instituto dos Registos e Notariado), Lisboa. Aproveito o tempinho disponível para alegremente me deslocar à meca do tão propagado simplex nacional. Objectivo: levantar o Cartão de Cidadão.

“É canja”, disse eu para com os meus poucos botões, verificando ao retirar a senha da maquineta que “apenas” três elementos se encontravam à minha frente. O entusiamo redobrou quando, já sentado numa das poltronas de tecido alaranjado escurecido pelo roçar das peidas e cobertas de manchas, cabelos e pintelhos, li uma das inscrições da referida senha que se destacava por estas simpáticas palavras : “tempo previsto de espera 7 minutos”!

Se fosse brasuca, provavelmente teria debitado um sonoro “Oba!”, no entanto, como cidadão marreta de segunda categoria, algo me fez moderar o contentamento, até porque nesta coisa de repartições púbicas, públicas digo, o lema costuma ser “quem espera (quase) sempre alcança”.

Giro o periscópio 180º e faço uma prospecção da fauna situada no outro lado da barricada com a benemérita missão de servir o cidadão. Não seriam mais do que cinco para dez cadeiras e a segunda impressão com que fiquei (a primeira já tinha ficado com ela na altura de requisição do Cartão de Cidadão) foi de que havia por ali servidores do Estado menos entendidos na prática técnico-mecânico-electrónica de atendimento, resolução e expediente, para que diligentemente teriam sido formados (ou reformados), no intuito de tão digníssima missão como é o nobre acto do atendimento público, do que eu na esmerada arte da puericultura.

Deixemo-nos de tretas e adiantemos os ponteiros do relógio para as 13:30h, hora precisa a que o catrapázio electrónico que mostra as letras a que cada tipo de serviço está agregado (certidões, informações, cartões, etc, etc, etc) com o número correspondente de atendimento se lembrou de avançar a letra D para o número seguinte. Ou seja, trocado por miúdos, ficaram a faltar mais dois elementos para chegar a minha vez, o que para quem com tanta simpatia foi tipograficamente informado que esperaria para aí uns 7 minutinhos não é nada entusiasmante.

Carregando no “forward”, para não perdermos muito tempo, chegamos ao ponto de saturação em que a coisa começa a descambar para a revolta, desiderato altamente perigoso que, como sabemos, pode conduzir à violência generalizada e ao caos.

Primeiramente, esta alminha marreta dirigiu-se a um funcionário e educadamente questionou se seria normal esperar 45 MINUTOS para que uma senha avançasse, tratando-se ainda por cima dos serviços mais rápidos e fáceis de escoar: a entrega de um simples cartão, que a mais não obriga do que uma deslocação de ½ metro à caixinha onde os mesmos se encontram, procurar o nome por ordem alfabética, entregar à pessoa e já está!

Ah e tal e tal, estamos na hora de almoço, às vezes o serviço entope, existem sempre dúvidas que é preciso esclarecer, o X está de baixa, o Y de férias, a máquina avaria, o cliente faz perguntas e temos que responder, surgem imprevistos,….

13:45h, a pouca distância, um outro “cliente” da letra D bufava e espumava da boca enquanto percorria vários metros em círculo num ritmo alucinante. Como que invadido por um impulso eléctrico avançou de uma só vez até ao guichet mais próximo e soltou um estridente “CARREGUE NA LETRA D!” que ecoou até ao topo da Torre Vasco da Gama. “Estou aqui há uma hora e esta merda não anda, enquanto as outras letras estão sempre a avançar!”, completou com mais um violento urro. E não é que resultou?! A letra D começou a fluir de uma forma tão rápida que em menos de 5 minutos estava cá fora de cartãozinho dentro da carteira e a salivar pelo repasto que tardava.

Como sempre reconheci, o método de acção directa é em 95% das vezes o mais eficaz na resolução destes contratempos irritantes. No entanto, reconheço também que com a idade se vai erradamente controlando estes propedeuticos impulsos que quando bem utilizados garantem sempre excelentes resultados. Neste particular caso, o meu conterrâneo da letra D antecipou-se à minha descarga de alta voltagem que estaria para muito breve e acabou ele por prestar um nobre serviço à causa pública, aos cidadãos e ao país transformando um complicadex num simplex.

4 comentários:

  1. Ora porra! Então não é que com umas asneirolas em Ré Maior a coisa rola que é uma maravilha! Estamos sempre a aprender...
    Cumps

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  2. Esse cidadão de segunda suponho, cagou-se nos brandos costumes da maralha subserviente e tal como eu já o fiz várias vezes, deu um valente berro na clausura vigente e o resultado esteve à vista, a "bicha" andou mais depressa.

    Há dias, nos serviços de água e saneamento cá do burgo tive uma situação em que me passei dos carretos e pimba, lá vai disto....
    Estava uma bicha do caraças, eu era o nº 57 e a coisa ia no 12, pensei, dá para ir beber uma bica, quando regressei ainda não tinha saído do dito, entretanto reparei que a funcionária respectiva não se encontrava no posto de trabalho, desloquei-me ao terminal das informações e perguntei qual o motivo de tanta demora, foi-me dito e passo a citar "a senhora foi à casa de banho, não pode"?, respondi que sim, mas porra (foi mesmo assim) vinte minutos para mijar ou cagar é demasiado, não acha? A resposta foi célere, "provavelmente para além de estar a fazer o que o senhor disse, pode também estar a retocar a maquilhagem, será que não pode também? Não somos escravas? Bem, caro amigo, aqui passei-me completamente, para além de alguns impropérios nos quais fui imitado pelos restante utentes, pedi de imediato o respectivo livro de reclamações, o que para além de mim fui seguido pela maioria dos presente, reclamação maciça portanto. Não demorou cinco minutos e mais três terminais de atendimento foram disponibilizados.

    Neste país onde a corrupção é lei e o cidadão honesto é remetido para o fim da linha, reclamar, barafustar, chamar os bois pelos nomes ainda compensa. Infelizmente.

    Abraço

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  3. Umas vezes vale mais a palavra, outras vezes o palavrão! Já ouvi falar desse cartão que serve para a malta não votar, parece que também o vou ter que tirar para o ano e, à cautela, vou tirar férias nessa altura.

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  4. E ainda dizem que a voz humana não tem poder?

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